Artigo Haikal Helou - Hospitais paulistanos: fatos e lendas
Confira o artigo "Hospitais: fatos e lendas" publicado hoje (12/08) no jornal O POPULAR
Aeroporto Santa Genoveva, o comandante anuncia a todos que a decolagem está autorizada. É o aviso de que não só chegaremos a São Paulo em aproximadamente uma hora, mas que todos os equipamentos eletrônicos devem ser desligados. Arrancado do hipnotismo do meu tablet, começo a observar as pessoas em volta, tentando adivinhar o motivo da viagem de cada uma. Alguns são óbvios: o casal em lua de mel, o executivo voltando para casa e o conterrâneo que busca tratamento em um dos grandes hospitais étnicos da capital paulista. Sobre o último, tenho algo que gostaria de refletir com vocês, não só como médico e empresário da área hospitalar, mas como filho e sobrinho que algumas vezes fez essa viagem também como o parente esperançoso.
Quando criança, acompanhei meu pai em muitas viagens, que na época chamava de turismo médico-hospitalar. De alguns países, só conheço hospitais, hábito que mantive na vida adulta, tendo feito residência e pós-graduação em grandes e famosos hospitais do Brasil e do mundo, e digo isso com um único propósito: embasar e dar credibilidade ao que afirmarei a seguir. Fatos e lendas se misturam, não raro, carregados de emoções, por experiências pessoais, familiares ou de amigos próximos. O que é fato sobre esses grandes hospitais paulistanos?
São estruturas excepcionais, recheadas da mais alta tecnologia e profissionais extremamente qualificados e capazes, não devendo em nada a hospitais do mesmo porte nas grandes cidades do mundo, com números impressionantes, como mais de 6 mil funcionários, corpo clínico com mais de 10 mil médicos e equipamentos de milhões de dólares.
Somam-se aos fatos, algumas lendas que podem parecer banais à maioria, mas, acreditem, já ouvi e não apenas uma vez. “O índice de infeção desse hospital é zero!” “Lá não ocorre erro médico há anos!” E até: “Fulano estava praticamente morto, foi para lá e dois dias depois estava andando e conversando, pronto para receber alta!”
Essas lendas de banais não têm nada, pois criam a ilusão e expectativa de que nessas estruturas não só se encontrarão bons tratamentos, mas milagres aos borbotões. A decisão de ir ou levar um parente para se tratar em São Paulo é, na maioria das vezes, baseada em muita reflexão e racionalidade, mas não deixa de ser repleta de emoções e tensões, e, nesse momento, fatores importantíssimos podem ser minimizados ou até mesmo esquecidos.
Ficar doente é sempre traumático e sofrido, mesmo cercado de amigos e parentes. Agora, imaginem isso a centenas de quilômetros de casa e só. A falta desse apoio familiar, não raro, gera depressão e angústia.
Outro fator pouco considerado é que certos tratamentos são longos e certas complicações relativamente comuns e, quando acontecem, colocam o paciente que buscou tratamento fora de Goiânia em um dilema: corro e pego o avião de volta para São Paulo para ver meu médico ou procuro alguém aqui para tratar apenas as complicações de um tratamento que é de outro profissional? A capital paulista está aqui do lado quando viajamos a negócios ou turismo com tempo e planejamento. Quando se trata de uma patologia grave, às vezes, simplesmente não dá tempo. Muitos já agravaram o quadro ou mesmo morreram esperando a UTI aérea que estava em outro deslocamento chegar.
Não vou nem focar no custo que todo esse deslocamento pode acarretar e que já levou à falência várias famílias, porque nessa hora queremos “o melhor” e isso não tem preço, mas tem um custo às vezes impagável.
Levantamentos informais de colegas que vivem e exercem a profissão em São Paulo revelam que Goiânia é porcentualmente o maior exportador de pacientes para os grandes hospitais da terra da garoa. Isso não quer dizer que pessoas não saiam de outras capitais para ter uma segunda opinião ou mesmo se tratar em São Paulo. Isso certamente acontece, mas com frequência muito menor que na nossa capital e a única explicação a existência de instituições que desfrutam da confiança dos pacientes em suas capitais. Precisamos disso em Goiânia, a partir de uma cobrança maior da clientela por estruturas mais seguras e resolutivas, quanto do reconhecimento desta mesma clientela quando as encontra, não aceitando um tratamento de qualidade inferior que algumas operadoras que só pensam em cortar custos tentam lhe empurrar goela a baixo, dizendo que os hospitais são todos iguais.
Haikal Helou é médico e presidente em exercício da Associação dos Hospitais Privados de Alta Complexidade do Estado de Goiás (Ahpaceg)