Postado em: 02/12/2024

CLIPPING AHPACEG 30/11 A 02/12/24

ATENÇÃO: Todas as notícias inseridas nesse clipping reproduzem na íntegra, sem qualquer alteração, correção ou comentário, os textos publicados nos jornais, rádios, TVs e sites citados antes da sequência das matérias neles veiculadas. O objetivo da reprodução é deixar o leitor ciente das reportagens e notas publicadas no dia.

DESTAQUES

Judicialização predatória afeta equilíbrio do setor de saúde

O papel da ANS na sustentabilidade do setor privado de saúde

Brasil tem carência de 1,5 mil leitos de UTI neonatal para atender recém-nascidos

Ex-secretário de saúde Wilson Pollara sofre infarto e é hospitalizado

Manobra de Kristeller é violência obstétrica e justifica indenização

Governo Lula descumpre portaria e gasta R$ 457 milhões com Zolgensma

Diagnóstico molecular, telemedicina e inteligência artificial começam a mudar a saúde da população brasileira

Mãe de bebê que morreu após serviço de home care da Prefeitura de Goiânia ser suspenso se revolta: 'Estão escolhendo quem salvar'

ESTADÃO ONLINE

Judicialização predatória afeta equilíbrio do setor de saúde

Crescimento do número de ações judiciais impacta previsibilidade, segurança e eficiência em pilar estratégico da Nação; no Congresso da Abramge, ministros do STF pedem 'redução de conflitos' e busca por parcerias

Entre janeiro e outubro de 2024, mais de 550 mil casos judiciais envolvendo temas de saúde pública e suplementar foram abertos na Justiça brasileira, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É um número que chama a atenção não só pelo valor absoluto, mas também pelo crescimento de 95% na comparação com o do mesmo período de 2020. Mais do que sobrecarregar o Poder Judiciário, a insegurança jurídica que afeta o sistema de saúde resulta em alta de casos abertos - atualmente na faixa dos 800 mil processos- e desequilíbrio em um dos setores mais importantes do Brasil. A extrema e indevida judicialização da saúde no Brasil foi um dos principais temas do 28º Congresso da Abramge, associação de operadoras de saúde suplementar que reúne 140 empresas em 19 Estados do País.

Realizado nos dias 21 e 22 de novembro de 2024, no Pavilhão da Bienal do Ibirapuera, em São Paulo, o evento teve a participação de autoridades do governo, do Supremo Tribunal Federal e lideranças da área da saúde. "São preocupantes os números no que concerne à judicialização, que cada vez mais se intensifica", destacou o ministro do STF Gilmar Mendes, que participou da abertura do evento e tem liderado esforços para implementar mudanças que levem à redução do número de casos.

Hoje, no Brasil, o principal motivo para a litigância na Saúde é a negação da cobertura assistencial e quebra de carência, segundo pesquisa da FGV Justiça liderada pelo ministro do Supremo Tribunal de Justiça Antonio Saldanha Palheiro. Em fala no evento, ele mostrou preocupação não só com o número de casos judiciais, mas também com as fraudes no setor. "A judicialização a gente enxerga, mas a fraude fica debaixo do tapete", ressaltou Saldanha.

Movimento

Reduzir a judicialização é uma demanda coletiva dos ministros da Suprema Corte, como demonstrou o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, também durante o evento. "Não é possível aumentar a estrutura do Judiciário se a judicialização aumentar, até porque o Judiciário é uma instância patológica na vida de um país. Os problemas devem ser resolvidos administrativamente, porque litigar é barato para quem litiga, mas é caro para a sociedade", declarou Barroso em sua fala, lembrando que o País gasta 1,2% do PIB com o Judiciário atualmente.

Barroso ressaltou ainda que muitos juízes possuem dificuldade de compreender o equilíbrio entre as decisões que proclamam e o sistema de saúde. "Os juízes não são treinados para fazerem análises sistêmicas, do impacto das decisões", disse o presidente do STF. "É preciso desfazer um equívoco que a decisão está entre a vida de um demandante e o limite orçamentário do outro: quando se direcionam recursos para um tratamento que custa R$ 10 milhões por mês, no final alguém não recebe esse dinheiro para sua assistência."

A busca por equilíbrio e eficiência foi uma das tônicas do evento, que contou ainda com a assinatura de um acordo de cooperação entre a Abramge e o IPSConsumo para compreender as causas da judicialização e com a presença de autoridades internacionais, como a ex-primeira-ministra britânica Theresa May, que trouxe exemplos de sucesso e desafios do sistema de saúde público do Reino Unido.

Outro tema importante no congresso foi a busca pela integração entre os sistemas de saúde público e privado no Brasil, como bem lembrou o ministro José Antonio Dias Toffoli. "A saúde suplementar também é pública e temos que pensar juntos", lembrou o magistrado do STF.

Ex-primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May falou sobre sucesso do sistema de saúde público mais antigo do mundo; já Rafael Caviedes mostrou como colapso da saúde no país latino pode se repetir aqui

Aprender com os próprios erros é bom. Aprender com erros e acertos dos outros é melhor ainda. Ao longo de seus dois dias de programação, o 28º Congresso da Abramge trouxe não só discussões vigorosas a respeito da saúde no Brasil, mas também exemplos de como diferentes modelos da gestão do setor ao redor do mundo podem ter impactos muito variados. Presentes no evento, a ex-primeira-ministra do Reino Unido Theresa May e o ex-presidente da associação de planos de saúde do Chile (Isapres) Rafael Caviedes trouxeram ensinamentos que podem servir de exemplo e alerta para o sistema brasileiro.

Utilizado por mais de 65 milhões de pessoas em todo o Reino Unido, independentemente da renda, o National Health Service (NHS) é o mais antigo sistema de saúde pública do mundo, tendo sido criado após os escombros da Segunda Guerra Mundial. "É um aspecto fundamental do serviço britânico. Ele é gratuito para todas as pessoas, mas temos muitos desafios ao longo do tempo", destacou Theresa May, em sessão na qual foi entrevistada pela jornalista Natuza Nery.

Entre os desafios, Theresa destacou o envelhecimento populacional, que faz com que o sistema precise arcar com doenças mais complexas, e a adoção de novas tecnologias. Quando esteve à frente do governo, a antiga premiê britânica promoveu um programa de reformas e investimento no NHS, aumentando em cerca de 20 bilhões de libras por ano os gastos do sistema - em 2025, o orçamento deve girar em torno de 190 bilhões de libras (cerca de R$ 1,38 trilhão).

Mais do que isso, porém, ela procurou promover e fiscalizar políticas capazes de controlar os gastos do serviço, como o uso de uma agência única para regular todo o sistema de saúde britânico - incluindo a oferta privada - e o foco na atenção primária. "Quando há algo errado, o primeiro passo é passar por um clínico-geral, designado para a área em que a pessoa vive. Ele é quem determina se você passa por um especialista. Se houver uma emergência, as pessoas vão direto ao hospital, mas esse clínico-geral é sempre informado", diz Theresa. "Triagem é o segredo para manter a integridade de todas as demais etapas do NHS."

Para desafogar o sistema, que atende mais de 1,3 milhão de pessoas diariamente, a ex-primeira-ministra reforçou os poderes de farmacêuticos, que podem ajudar em casos de menor gravidade. "São profissionais que têm expertise para lidar com alguns assuntos, o que nos ajuda a diminuir o problema de pressão dos clínicos-gerais e dos hospitais", ressaltou. Outro ponto importante, segundo a inglesa, foi reforçar políticas de prevenção. "Precisamos encorajar comportamentos saudáveis, como o que as pessoas comem, se exercitam, como se informam e como cuidam de si mesmas", disse May.

Ao falar sobre o futuro do sistema de saúde britânico, May destacou ainda a importância que o NHS terá no combate a questões de saúde mental. "Nós precisamos quebrar o gelo com essa conversa. Um ponto particularmente importante é discutir a saúde mental dentro dos locais de trabalho, o que pode levar a perdas de produtividade importantes", declarou a ex-líder do Partido Conservador do Reino Unido. Para ela, é um tema que tem impacto especial na população jovem, ainda mais após a pandemia da covid-19.

Crise no Chile

Na sequência da fala de Theresa May, o ex-presidente da associação de planos de saúde privados do Chile (conhecida pela sigla Isapres) Rafael Caviedes falou sobre como o sistema de saúde no país latino entrou em colapso nos últimos anos.

Estabelecido nos anos 1980, o modelo de saúde chileno é, assim como o brasileiro, dividido entre um sistema público e outro privado. Lá, os chilenos devem dedicar 7% de seu salário para a saúde. Eles podem optar por fazer contribuições para um fundo nacional público, usado por 80% da população, ou para uma associação privada pertencente à Isapres. "É um serviço complementar. Quando se adere a um plano de saúde particular, o chileno não utiliza a rede pública", explicou Caviedes.

Com alto índice de judicialização, especialmente por conta de reclamações acerca de tabelas de preços que diferenciavam pacientes por fatores de risco que incluíam gênero e idade, o país acumulou decisões em favor dos usuários. As operadoras protestaram, o que levou a uma intervenção da Justiça em 2022.

Na ocasião, a Suprema Corte local decidiu que as operadoras de saúde privadas deveriam não só encerrar a diferenciação, mas também ressarcir os usuários pela diferença de valores pagos desde 2019, em uma dívida que chegaria a US$ 1,5 bilhão. "Foi uma decisão muito dura", destacou Caviedes. "Sinceramente, não sabemos como as coisas vão ficar nos próximos anos. É o que acontece quando se mudam as regras do jogo do nada."

Durante o evento da Abramge, a fala de Caviedes foi vista como um alerta para a realidade da saúde suplementar brasileira, cujos últimos anos foram marcados por altos índices de judicialização e mudanças de normas e incorporação de novas leis sem qualquer avaliação de impacto regulatório. O que a princípio pode parecer um benefício pode acabar por prejudicar o acesso à saúde. "Para ter uma evolução concreta, precisamos trabalhar em temas como segurança jurídica e a utilização de uma agência única de incorporação. Esperar e não fazer significa ver o colapso do sistema, como aconteceu no Chile", destacou Gustavo Ribeiro, presidente da Abramge, durante conversa com o jornalista Márcio Gomes e o ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia, ao final do evento.

Observatório buscará entender motivos da judicialização na saúde

Acordo de cooperação entre a Abramge e o IPSConsumo permitirá estudo qualitativo de reclamações e ações judiciais; primeira fase do processo deverá ser revelada no final de 2025

Com cerca de 55 mil causas judiciais iniciadas por mês entre janeiro e outubro de 2024, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o setor de saúde é um dos mais judicializados do Brasil - a despeito de não ocupar os primeiros lugares quando o assunto são reclamações administrativas, seja no Procon ou em serviços como o Consumidor.gov . A fim de entender tal descompasso e caminhar em busca de evolução, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) firmou, durante seu 28º Congresso, um acordo de cooperação com o Instituto de Pesquisa e Estudos da Sociedade e Consumo (IPSConsumo) para aprofundar estudos sobre os motivos da judicialização extrema do mercado.

Chamada de Observatório do Consumidor da Saúde, a iniciativa pretende analisar, de maneira independente, dados obtidos a partir de reclamações e ações judiciais envolvendo as mais de 140 operadoras de saúde associadas à Abramge. "A litigância é prejudicial para todos, até porque o que é investido para se defender deixa de ser utilizado na atuação da assistência de saúde", destaca Juliana Pereira, presidente do IPSConsumo e ex-secretária nacional do Consumidor, entre os anos de 2012 e 2016. "Precisamos dar um passo de maior profundidade para entender, por exemplo, se há situações não contempladas pela regulação ou se há judicialização mesmo com a regulação."

Nos próximos meses, a iniciativa pretende reunir especialistas de diferentes setores para começar o trabalho de estudo dos dados. De acordo com Juliana, a expectativa é de que a primeira parte do trabalho, voltada a uma análise qualitativa de reclamações e ações judiciais, seja concluída até o final de 2025, perto da próxima edição do Congresso da Abramge.

Para a presidente do IPSConsumo, a iniciativa da Abramge é elogiável por buscar compreensão e responsabilidade. "É a primeira vez que eu vejo um passo dado de forma transparente num compromisso dessa envergadura", disse ela, durante a cerimônia de assinatura do acordo de cooperação. "Queremos ajudar a reduzir os conflitos no mercado e discutir que processos podem ser aprimorados."

Ao longo do processo, as descobertas devem ser divulgadas tanto pelo instituto de pesquisa quanto pela Abramge. "Queremos consolidar não só volumes estatísticos, mas também entender o que está por trás das estatísticas", ressaltou ainda Juliana Pereira. A pesquisadora demonstrou ainda o interesse em ampliar o escopo do Observatório. "Espero que o poder público se junte a nós, porque este é um tema importante também para as políticas públicas."

Depois da análise, será feito um plano de ação, entregue à Abramge para que a associação possa trabalhar nas questões - seja na comunicação dos planos de saúde, na venda, nos contratos ou até mesmo na regulação do setor. "A judicialização é um efeito, e não uma causa. Para olharmos a causa, precisamos entender os consumidores - e não podemos esquecer que o principal motivo de o setor de saúde suplementar existir é o consumidor. A busca é por esse diálogo", complementou Gustavo Ribeiro, presidente da Abramge.

Notas técnicas

Além do acordo de cooperação entre IPSConsumo e Abramge, outra importante parceria anunciada nos últimos dias pode impactar diretamente as ações judiciais envolvendo a saúde suplementar. Bastante celebrado durante o 28º Congresso da Abramge, um acordo entre o CNJ e a ANS prevê a elaboração de notas técnicas e pareceres científicos para auxiliar os juízes em casos que envolvem o tema da saúde suplementar.

Já existente no campo da saúde pública, a parceria abastecerá o Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (e-NatJus) para que, em poucas horas ou alguns dias, os magistrados tenham apoio na hora de proferir suas decisões. "Um juiz não pode mais decidir sem ouvir uma manifestação técnica", destacou o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, em sua fala durante o Congresso da Abramge.

"Hoje, é até desumano que um juiz de direito tenha de responder a questões técnicas que qualquer pessoa leva dez anos, entre faculdade, residência e especialização, para conseguir compreender. É uma novidade que vai ajudar muito e o CNJ está no caminho certo", complementou Gustavo Ribeiro, da Abramge. É também um avanço que ajuda a integrar o esforço de saúde pública e privada serem vistas como parte de um só sistema, percepção que precisa ser mais difundida no País.

Integração de sistemas e uso de novas tecnologias entram em pauta no Congresso

Empresas, autoridades e especialistas debateram a necessidade de criação de agência única de incorporação de medicamentos, interoperabilidade de dados e uso de inteligência artificial

A discussão sobre a crescente judicialização na saúde brasileira não foi a única pauta do 28º Congresso da Abramge. Ao longo de 12 horas de evento, mais de 30 palestrantes e mil inscritos - entre representantes de empresas, autoridades dos três Poderes e especialistas do setor - debateram temas que podem auxiliar o setor a reduzir gastos, ser mais eficiente e trazer melhor atendimento para os brasileiros. Entre as principais pautas, estiveram assuntos como a necessidade de uma criação de agência única de incorporação de medicamentos, a interoperabilidade de dados dos pacientes e o uso de inteligência artificial.

Hoje, o Brasil tem um sistema duplo de incorporação de medicamentos e tratamentos na saúde: enquanto a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) cuida do setor público, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem seu próprio rol. É uma situação que, na visão do setor, cria distorções.

"Com duas agências, o modelo fragiliza o setor de saúde suplementar: quando a Conitec aprova um medicamento, as associadas da ANS têm 60 dias para incorporar, mesmo com projetos e precificações diferentes. Ao desbalancear um lado, o outro sente o impacto", afirmou Ludhmila Hajjar, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, em uma das falas mais aplaudidas do evento. "É meu desejo que a gente tenha uma bela agência de incorporação única, até para o setor ter mais margem de discussão com a indústria farmacêutica."

A criação de uma agência única também evitaria desigualdades na forma com que as pessoas são tratadas. "Não existe remédio para o brasileiro A ou para o brasileiro B, são todos brasileiros", destacou Marcos Novais, diretor executivo da Abramge, ressaltando que países como Inglaterra, Canadá ou Austrália trabalham com modelo semelhante, além de terem um sistema de monitoramento robusto para acompanhar a inserção de novas possibilidades.

Dados e IA

Outra demanda antiga e que poderia auxiliar na integração dos sistemas de saúde público e privado é a existência de um protocolo de interoperabilidade de dados - que permitiria, por exemplo, a um médico saber o histórico de exames e enfermidades de um paciente, com o devido consentimento. É algo que poderia auxiliar muito não só na resolução de emergências, mas também fazer o setor ganhar eficiência.

"A interoperabilidade hoje é uma necessidade", destacou Ana Estela Haddad, secretária de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde. Durante o debate, ela declarou que o ministério está trabalhando nas bases do sistema. "Estamos preparando o terreno em todo o território brasileiro, com ações de conectividade, equipamentos, prontuário eletrônico. A aposta do ministério é na Rede Nacional de Dados de Saúde (RNDS), com mais de 2,3 bilhões de dados", disse a secretária, cujo posto foi criado no início da atual gestão de Nísia Trindade, em janeiro de 2023.

"A interoperabilidade não é só para o SUS, mas também para a saúde suplementar, porque a jornada de um paciente passa pelos dois lados", ressaltou ainda Ana Estela, que conclamou os presentes a baixarem o app Meu SUS Digital, onde os dados de cada cidadão brasileiro estarão reunidos a partir da RNDS. A rede de dados é também um primeiro passo importante para a organização do uso de inteligência artificial dentro do setor, mas não o único: em sua fala, Ana Estela ressaltou a necessidade da regulamentação da tecnologia, atualmente sendo discutida no Congresso Nacional.

Definições também precisam ser feitas em legislações já existentes, como a Lei Geral de Proteção de Dados, cuja regulamentação ainda precisa ser mais bem debatida para auxiliar o setor. "Quem atua com saúde sabe como a LGPD dificulta o tratamento de dados no setor e traz ambiguidade em relação ao entendimento da população", reclamou a advogada Walquiria Favero, sócia no escritório Machado Melo e Favero Advogados, em debate que discutiu a implementação de IA na área.

No mesmo painel, o advogado Bruno Marcelos ressaltou a dificuldade de a regulação seguir o compasso da tecnologia. "Mas espero que nossa regulação seja capaz de acompanhar o desenvolvimento, garantindo segurança de dados e equilíbrio para o mercado", ressaltou.

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O papel da ANS na sustentabilidade do setor privado de saúde

O envelhecimento da população, o aumento da judicialização na saúde, entre outros, são desafios que precisam ser discutidos para que os integrantes do complexo econômico e produtivo da saúde encontrem soluções consensuais

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foi criada em janeiro de 2000, através da Lei n.º 9.961, ou cerca de um ano e meio após a sanção da Lei n.º 9656, que regulamenta esse setor. Como autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, a agência tem como finalidade institucional regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades que garantem a assistência suplementar à saúde; promover a defesa do interesse público, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores; e contribuir para o desenvolvimento das ações de saúde no País.

No decorrer dos seus quase 25 anos de existência, dados da própria ANS mostram como o mercado vem se adaptando à regulamentação. Quando a agência foi criada, atuavam nesse setor 2.723 operadoras de planos de saúde, que possuíam cerca de 31 milhões de beneficiários, ou 18% dos 170 milhões de brasileiros da época. Em novembro de 2024, o número de empresas com beneficiários caiu para 909 (redução de 67%), e o de usuários da saúde suplementar saltou para 51,4 milhões, que representam 24% da atual população de 212,6 milhões, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Portanto, em duas décadas e meia, houve um incremento de 66% no número de usuários, mas a cobertura populacional da saúde suplementar cresceu 33%, pouco acima do crescimento registrado pela população brasileira, que foi de 25%.

O porcentual de beneficiários ligados a planos coletivos ou por adesão, que não têm o reajuste controlado pela ANS, é o termômetro que baliza esse crescimento. No final de 2000, esses planos possuíam 36% do total de beneficiários; hoje, detêm 83% deles, um aumento de mais de 130%. A concentração é outro fruto do mercado regulado: atualmente, 14 operadoras de planos de saúde, ou 1,5% das existentes, concentram 45% dos usuários.

A necessidade de regulamentar esse segmento é inquestionável, pois ele responde pela assistência à saúde de quase um quarto dos brasileiros e realizou, em 2023, segundo o Mapa Assistencial da Saúde Suplementar, 9,2 milhões de internações, 275,3 milhões de consultas médicas, 1,1 bilhão de exames diagnósticos e 79,9 milhões de terapias. É, portanto, parte integrante e importante do Sistema Único de Saúde (SUS).

As agências reguladoras desempenham papel valioso na democracia, na garantia da prestação de serviços e na defesa do consumidor. Por atuarem com autonomia e participarem de forma indireta da administração do Estado, buscam garantir assimetria entre os interesses dos usuários, das organizações envolvidas e do Poder Executivo. Por isso, a indicação para composição de suas diretorias deve sempre ser feita obedecendo a critérios técnicos, e nunca políticos, para que elas possam se empoderar e fazer o que deve ser feito.

No setor da saúde, de relevância notória para o desenvolvimento socioeconômico do País, a ANS tem uma missão importantíssima na defesa dos usuários e como protagonista da sustentabilidade do setor privado de saúde. O envelhecimento da população, o aumento das doenças crônicas, de casos relacionados à saúde mental, a incorporação profícua de novas tecnologias, o aumento da judicialização na saúde, a capacidade limitada de pagamento por parte dos beneficiários, o difícil relacionamento entre operadoras e prestadores e a ameaça iminente de novas endemias e pandemias, entre outros, são desafios que precisam ser seriamente discutidos para que os integrantes do complexo econômico e produtivo da saúde encontrem soluções consensuais. A agência pode e deve fomentar esses debates.

Certamente todos, sem exceção, terão de inovar, confiar uns nos outros, aprender a fazer melhor e diferente. Talvez essa missão não seja tão árdua, afinal, os grandes desafios da saúde já são conhecidos. Um provérbio japonês, porém, ensina que "tropeçamos nas pequenas pedras, porque as grandes a gente logo enxerga". Que os que integram o ecossistema da saúde tenham bom senso e essa visão de curto e longo alcance, para o bem do setor, da sociedade e do País.

* Médico, é presidente da Fesaúde-SP e do SindHosp

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AGÊNCIA ESTADO

Brasil tem carência de 1,5 mil leitos de UTI neonatal para atender recém-nascidos

Das 27 unidades federativas do Brasil, 17 dispõem de menos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal do que o recomendado pela literatura científica. É o que afirma a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) em um novo levantamento. De acordo com a pesquisa, seriam necessários 1,5 mil novos leitos no País para que essas regiões atingissem a cobertura adequada.

Segundo o Ministério da Saúde, 340 mil bebês nascem prematuros todo ano, o equivalente a 930 por dia. O sistema de saúde, porém, dispõe de 10.288 leitos de UTI para atendê-los, número inferior ao recomendado por entidades internacionais e nacionais, como a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Para estas, a oferta de leitos de UTI para recém-nascidos deve ser de, no mínimo, quatro para cada mil nascidos vivos.

A conta feita pela Amib abrange tanto leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) quanto do setor privado. Quando considerados apenas os leitos públicos, o quadro piora: nenhum Estado alcança a quantidade adequada. Os números foram levantados a partir do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), do Ministério da Saúde, e são referentes ao mês de dezembro de 2023. As informações foram cruzadas com os registros do Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (Sinasc) do mesmo ano.

Distribuição desigual
No Norte, a média regional é de apenas 2,42 leitos para cada mil nascidos vivos. De acordo com o levantamento, seriam necessárias cerca de 450 vagas adicionais na região para alcançar a recomendação mínima. Em contrapartida, na região Sudeste, a média total é de 5,55 leitos de UTI neonatal para cada mil nascidos vivos. Os locais com a situação mais crítica são Acre, Amazonas, Roraima e Maranhão, onde há menos de dois leitos por 1 mil nascidos vivos. No Acre, estão disponíveis 15 leitos no SUS e 13 na saúde suplementar.

Em contrapartida, o Estado teve 23.912 nascidos vivos em 2023, o que lhe rende uma média de 1,94 leitos para cada mil nascidos vivos. Nesse cenário, seriam necessários mais 30 leitos para alcançar o total recomendado. No Amazonas, são 59 leitos no SUS e 73 na rede privada, gerando um déficit de 149 leitos. Em Roraima, onde há 23 leitos no SUS e dois na saúde suplementar, seriam necessários 27 novos leitos. Já no Maranhão, com 156 leitos no SUS e 21 particulares, faltam 212 leitos para a média indicada pelas entidades médicas.

Veja média de leitos de UTI neonatal em cada estado:
- Acre: 1,94
- Alagoas: 3,03
- Amapá: 2,85
- Amazonas: 1,88
- Bahia: 2,73
- Ceará: 2,57
- Distrito Federal: 5,63
- Espírito Santo: 5,15
- Goiás: 3,38
- Maranhão: 1,82
- Mato Grosso: 3,64
- Mato Grosso do Sul: 2,96
- Minas Gerais: 4,10
- Pará: 2,25
- Paraíba: 2,52
- Paraná: 4,49
- Pernambuco: 2,56
- Piauí: 2,73
- Rio de Janeiro: 9,05
- Rio Grande do Norte: 4,11
- Rio Grande do Sul: 4,24
- Rondônia: 4,18
- Roraima: 1,91
- Santa Catarina: 3,97
- São Paulo: 5,03
- Sergipe: 3,62
- Tocantins: 2,85

Para Amarílis Batista Teixeira, coordenadora do Departamento de Neonatologia da Sociedade Mineira de Terapia Intensiva, ligada à Amib, os dados sobre déficits são um alerta, pois a escassez de leitos está ligada a maiores taxas de mortalidade neonatal, principalmente em regiões com infraestrutura deficiente. "Muitos recém-nascidos poderiam ter desfechos melhores se tivessem acesso oportuno a suporte ventilatório, monitoramento avançado e intervenções especializadas, sem sobrecarregar outras unidades de saúde, comprometendo a qualidade do cuidado", reflete.

Taxas 'em conformidade com o Ministério da Saúde'
O ministério estabelece que o mínimo de leitos de UTI neonatal no Brasil deve ser de dois por mil nascidos vivos, conforme a Portaria GM/MS nº 930, de 2012. Porém especialistas como Nilzete Bresolin, diretora vice-presidente da Amib, reforçam que o ideal seriam quatro leitos por mil recém-nascidos, número baseado em estudos epidemiológicos e análises estatísticas de necessidades assistenciais. A portaria também estabelece que o cuidado neonatal deve ser progressivo. "Ou seja, complementado com leitos de Unidade de Cuidados Intermediários Neonatal Convencional (UCINCo) e Unidade de Cuidados Intermediários Neonatal Canguru (UCINCa)", afirma o ministério em nota.

A pasta argumenta que "o desenho da rede e a definição dos leitos é conduzido pelos estados e municípios e o Ministério da Saúde atua para o incentivo e qualificação dos mesmos, por meio das habilitações com recursos financeiros e processos formativos".

Procurada, a Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão informou, em nota, que o Estado conta atualmente com 134 leitos de UTI neonatal, distribuídos em 10 dos 19 serviços de parto sob gestão estadual. A pasta afirmou que "está em conformidade com a portaria de 2012" do ministério e adicionou que "está planejando ampliar o número de vagas".

Em Roraima, a Secretaria de Saúde disse que, em setembro de 2024, ampliou o número de leitos na UTI Neonatal do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth, passando de 28 para 66. O órgão acrescentou que a taxa de ocupação da UTI é de aproximadamente 65% durante períodos sazonais de gripe, sem registro de demanda reprimida, o que "atende a atual realidade e rotina hospitalar". Os governos do Acre e do Amazonas não responderam até a publicação do texto. 

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O HOJE

Ex-secretário de saúde Wilson Pollara sofre infarto e é hospitalizado

Pollara foi preso na última quarta-feira (27) durante a Operação Comorbidade, que investiga irregularidades na gestão da Secretaria Municipal de Saúde

O ex-secretário de saúde Wilson Pollara, de 75 anos, sofreu um infarto na tarde deste domingo (1º/12) e foi levado pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) ao Centro Integrado de Atenção Médico Sanitária (Ciams) Novo Horizonte, onde passa por exames.

Pollara foi preso na última quarta-feira (27) durante a Operação Comorbidade, conduzida pelo Ministério Público de Goiás (MPGO), que investiga irregularidades na gestão da Secretaria Municipal de Saúde.

A saúde do ex-secretário havia sido apontada por sua defesa como argumento em um pedido de habeas corpus, negado pelo Judiciário em caráter liminar.

De acordo com a defesa, Pollara apresenta histórico de problemas cardíacos, incluindo doença arterial coronariana, arritmias e hipertensão arterial, além de já ter enfrentado tratamentos contra dois tipos de câncer. Além disso, estaria tendo dificuldades de se locomover por conta de problemas musculares.

A operação teve como alvos, além de Pollara, outros ex-gestores da pasta. O MPGO sustenta que há indícios de desvios de recursos e práticas ilícitas durante a gestão investigada, embora detalhes sigam sob sigilo judicial.

A defesa de Pollara questiona a prorrogação de sua prisão, alegando que as condições de saúde do ex-secretário tornam o encarceramento inadequado.

No sábado (30), o MPGO obteve a prorrogação da prisão temporária de Pollara por mais cinco dias, fundamentada pela necessidade de aprofundar as investigações.

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CONSULTOR JURÍDICO

Manobra de Kristeller é violência obstétrica e justifica indenização

A manobra de Kristeller, procedimento que consiste em pressionar a parte superior do útero de uma gestante para tentar forçar a saída do bebê durante o parto, é considerada prática de violência obstétrica , o que gera dever de indenizar.

Com esse entendimento, o juiz Sérgio Menezes Lucas, da 1ª Vara Cível de Aracaju, determinou que um hospital e um plano de saúde indenizem em R$ 50 mil uma mulher a título de reparação por danos morais.

Na ocasião em que ela deu à luz o filho, a equipe do hospital, ao qual a gestante teve acesso pelo plano, não administrou anestesia suficiente, o que fez com que ela sentisse os instrumentos médicos e dores extremamente fortes durante o parto.

A mulher também foi submetida à manobra de Kristeller, que, além de ser ineficaz na maior parte dos casos, é também contraindicada pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial de Saúde (OMS), "principalmente pelo risco de danos neurológicos irreversíveis no feto e danos ginecológicos na mãe, o que restou comprovado nos autos", conforme escreveu o julgador, em referência às sequelas sofridas pela mulher.

"A indenização pelo dano moral não tem o objetivo de reparar a dor, mas de compensá-la de alguma forma, minimizando o sofrimento da autora que sofre em razão da violência obstétrica sofrida quando da prática de manobra proibida, causando-lhe danos."

Atuou na causa o advogado Carlos Henrique de Lima Andrade . "Essa condenação reforça o direito das mulheres a um parto humanizado e digno. A violência obstétrica é uma realidade que precisa ser combatida", comentou ele.

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METRÓPOLES

Governo Lula descumpre portaria e gasta R$ 457 milhões com Zolgensma


Ministério da Saúde atrasa distribuição do Zolgensma desde junho de 2023. Judicialização é o caminho encontrado para os pacientes
O Ministério da Saúde gastou R$ 457 milhões com o fornecimento do Zolgensma - usado contra Atrofia Muscular Espinhal (AME) tipo I - em 2023 e 2024. Essa terapia gênica da Novartis deveria estar disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) desde 4 de junho do ano passado, mas ainda não é ofertada aos pacientes. Uma das saídas encontradas para que não fiquem sem tratamento passa pela judicialização.

Ao todo, o governo federal desembolsou R$ 305 milhões em 2023, com 64 ações judiciais em 12 estados e no Distrito Federal. Mais R$ 152 milhões saíram dos cofres em 2024, com 41 processos em nove estados e na capital federal - recordista em casos judicializados.

A coluna obteve os dados a partir da Lei de Acesso à Informação (LAI). A resposta chegou na última quarta-feira (27/11).

O Instituto Nacional da Atrofia Muscular Espinhal (Iname) estima que haja 1.795 pacientes com AME no Brasil. Do total, 75 têm até 2 anos, idade limite para o uso do medicamento, de acordo com o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Das oito terapias gênicas aprovadas pela Anvisa, o maior gasto durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se dá, disparadamente, com o Zolgensma (onasemnogeno abeparvoque). O valor acumulado dele é 44 vezes maior que o do segundo lugar: o Kymriah (tisagenlecleucel), para tratar alguns tipos de câncer de sangue, custou R$ 10,3 milhões ao governo - foram quatro processos neste ano.

Já o Luxturna (voretigeno neparvoveque), contra perda de visão causada por distrofia hereditária da retina, ocupa a terceira posição: foram R$ 4,6 milhões em um processo de 2023. Não houve judicialização dos outros cinco medicamentos no período.

O principal entrave para a disponibilização no SUS, apurou a coluna, é o preço que o governo arcará pelo Zolgensma, que ainda não está definido. Segundo interlocutores ligados ao tema, a pasta e a Novartis se reúnem nesta segunda-feira (2/12) para discutir ajustes no acordo de compartilhamento de risco (ACR). O último encontro foi em 22 de novembro.

"O maior desafio das pessoas com AME hoje é a equidade, ou seja, o acesso aos tratamentos para todos. Temos um medicamento que está incorporado, mas ainda não está disponível para as famílias: o Zolgensma. Temos, ainda, os pacientes do tipo III, que continuam sem acesso a tratamento. Essas duas questões precisam de solução urgente, pois quem tem uma doença degenerativa não pode esperar", afirmou a diretora nacional do Iname, Diovana Loriato.

O que existe até o momento é um protocolo de intenções, assinado pelo ex-ministro da Saúde Marcelo Queiroga e pela Novartis em dezembro de 2022, às vésperas do fim do mandato. As diretrizes do SUS, de acordo com o anúncio oficial da época, definem que bebês com AME tipos I de até 6 meses e fora da ventilação invasiva por mais de 16 horas diárias podem ser contemplados.

À época, a justificativa dele para restringir a idade foi a maior eficácia do tratamento nessa faixa etária. Há famílias, porém, que judicializam o pedido da terapia gênica fora dos critérios estabelecidos pela pasta.

"Para que o medicamento seja disponibilizado à população, é necessária a atualização do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) e a formalização de um Acordo de Compartilhamento de Risco (ACR), atualmente em fase de pactuação. Assim, o Ministério da Saúde oferece o medicamento Zolgensma apenas mediante ordem judicial, com a devida instrução da Advocacia-Geral da União", informou a pasta em nota.

Diagnóstico de AME

Outra dificuldade passa pelo diagnóstico, que, muitas vezes, é de difícil acesso e precisa ser precoce para haver uma melhor evolução no tratamento.

"Se a criança não recebe (o Zolgensma), perde toda a possibilidade de ter uma melhora clínica, porque o problema da AME é que os neurônios que são perdidos não são recuperados. O que se espera é que não perca os neurônios. Por isso, a ideia é começar o quanto antes", disse a geneticista e professora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), Mayana Zatz.

A Lei 14.154/2021, que institui o teste do pezinho ampliado, tenta mudar esse cenário ao incluir a detecção da doença em recém-nascidos na quinta fase do exame. Essa legislação, porém, ainda não foi regulamentada. Distrito Federal e Minas Gerais são minoria ao oferecê-lo já com o diagnóstico de AME, uma vez que o avanço do Programa Nacional da Triagem Neonatal (PNTN), do Ministério da Saúde, é desigual no Brasil.

É responsabilidade da pasta comprar o Zolgensma, de forma centralizada com a fabricante. Segundo ofício enviado à coluna, o orçamento destinado a decisões judiciais está alocado conforme a Política ou o Programa de Saúde a que esteja ligado, em conjunto com a Subsecretaria de Planejamento e Orçamento (SPO). O do Zolgensma é vinculado à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação e ao Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Sectics), comandada pelo economista Carlos Gadelha.

Associações se uniram para pressionar o governo pela liberação da terapia gênica. "Até que as famílias consigam o medicamento pela via judicial (o que pode demorar mais de 12 meses), os pacientes iniciam o tratamento com outro medicamento disponível no SUS. O custo, também elevado, desse tratamento ponte poderia ser evitado caso o Zolgensma estivesse disponível de imediato como primeira opção terapêutica", diz manifesto do Universo Coletivo AME, obtido pela coluna.

6 imagens Fechar modal. 1 de 6 Ministério da Saúde também está na ação Marcelo Camargo/Agência Brasil 2 de 6 Igo Estrela/Metrópoles 3 de 6 Ministra da Saúde, Nísia Trindade, participa de evento na Fiesp Fábio Vieira/Metrópoles 4 de 6 Ministra da Saúde, Nísia Trindade Fábio Vieira/Metrópoles 5 de 6 Ministério da Saúde apresentou distorção de R$ 44 bilhões em suas contas de 2023 Rafaela Felicciano/Metrópoles 6 de 6 Ministério da Saúde, onde fica a Funasa Ministério da Saúde

Caminho do Zolgensma no SUS e nos planos de saúde

Um dos medicamentos mais caros do mundo, o Zolgensma entrou para o SUS em dezembro de 2022, após aval da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). A partir de então, a Saúde tinha 180 dias para publicar o Protocolo de Tratamento e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) - documento que norteia o cuidado com o paciente - e disponibilizar a terapia gênica.

O prazo, estipulado pela Lei 12.401/2011 e pelo decreto 7.646/2011, não se concretizou. A espera pelo Zolgensma soma quase 1 ano e 6 meses na rede pública até esta segunda-feira (2/12).

A decisão de incluí-lo no SUS não ocorreria se o parecer inicial, desfavorável à incorporação, fosse mantido. Veio, então, a consulta pública e a proposta da Novartis de fazer um acordo de compartilhamento de risco (ACR).

Esse último ponto mudou o rumo da decisão. Com a proposta na mesa, o ministério e a fabricante se propuseram a dividir a responsabilidade. Funciona da seguinte maneira, segundo o anúncio oficial: o pagamento deve se dividir em cinco parcelas anuais, de 20% do valor cada, condicionadas à evolução do paciente. Desse total, segundo a Novartis, 3% devem ser revertidos para o PNTN.

Dessa forma, a União não precisará arcar com os custos em caso de morte ou de piora. Os termos do acordo ainda estão em debate.

"A Novartis é contrária a judicialização como política de acesso a medicamentos, pois entendemos que isso prejudica a sustentabilidade do sistema e não garante o amplo acesso dos pacientes. Por isso, a companhia trabalha em estreita parceria e colaboração com os atores do sistema de saúde para viabilizar modelos customizados e sustentáveis de acesso. Dessa forma, todos os centros habilitados para o tratamento com ZOLGENSMA já possuem acordos comerciais estabelecidos e estão aptos a negociar os casos individualmente, caso necessário", diz a nota.

Os requisitos do SUS também valem para os planos de saúde. O Zolgensma entrou para o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em fevereiro de 2023. Desde então, os planos de saúde são obrigados a custeá-lo, o que gerou uma discussão no setor.

O prazo das operadoras é menor que o da rede pública, uma vez que a Lei 14.307/2022 estabelece que os planos têm até 60 dias para incluir um tratamento recomendado pela Conitec e, posteriormente, incorporado pela Saúde.

O que é AME

A AME é uma doença genética rara, degenerativa, progressiva e hereditária que acomete células nervosas da medula espinhal e do cérebro. A causa reside numa mutação no gene SMN1, responsável pela produção da proteína SMN - a falta dela ocasiona na degeneração e na morte de neurônios motores, que controlam os movimentos musculares do corpo.

A doença se divide entre os tipos I (mais grave, afeta bebês), II (aparece em crianças de até 10 anos) e III (surge na adolescência e na vida adulta), explica Zatz, da USP. Estima-se que a AME acometa 1 em cada 10 mil pessoas. Além do Zolgensma, a Saúde já incorporou o nusinersena e o risdiplam como tratamentos.

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CANAL COM Q

Diagnóstico molecular, telemedicina e inteligência artificial começam a mudar a saúde da população brasileira


Quando se fala sobre como melhorar a saúde da população brasileira, sempre pensamos em altos custos, necessidade de mais recursos e sobre o desafio de levar mais médicos e construir novos hospitais nas imensas áreas deste país/continente, onde parcela significativa da população continua a viver longe das grandes cidades e de boa infraestrutura da saúde pública.

Uma revolução silenciosa está ocorrendo, entretanto, não só com a telemedicina, que leva de forma virtual o médico até o paciente por mais distante que ele resida, mas principalmente graças ao diagnóstico molecular multiplex. Ele reduz drasticamente a espera para o resultado de um teste, permite que imensa quantidade de pacientes, que de outra forma não teriam sua patologia diagnosticada, passem a ter diagnóstico e, consequentemente, tratamento eficaz.

Atualmente, para citar alguns exemplos, o paciente dos rincões que na sua linguagem peculiar se queixa de 'dor na cacunda', 'que não para nada no estômago' ou que 'tenho uma lombeira, não consigo nem trabalhar', começa seu 'tratamento' tomando o chá caseiro recomendado pelo vizinho.

Quando isso não resolve vai trabalhosamente para a cidade muitas vezes para que a consulta com especialista seja marcada para semanas depois. Volta para o 'sertão' ou para o 'sítio' para regressar de novo à cidade, ser atendido e fazer um exame cujo resultado sairá em uma semana ou dez dias, tornando necessária outra viagem, que geralmente acaba não fazendo.

Resultado: continua convivendo com a doença que não sabe qual é e quando o tempo passa e a situação se agrava, é levado de novo para a cidade, já então para ser hospitalizado e submetido a um tratamento dispendioso, demorado, que teria sido evitado com o diagnóstico precoce e o combate imediato à doença.

Com a incorporação da agenda ESG (environmental, social and Governance), que objetiva atender às necessidades sociais, ambientais e à governança, os planos de saúde e governos (municipais, estaduais e federal) estão se voltando para redes de alto desempenho e centros de excelência que facilitam o acesso e a qualidade dos cuidados, principalmente aos pacientes mais vulneráveis.

A implementação de unidades móveis de diagnóstico, as campanhas de conscientização sobre a importância da detecção precoce de doenças e a capacitação de profissionais locais são algumas maneiras de usar as novas tecnologias para beneficiar comunidades vulneráveis.

Com o diagnóstico molecular multiplex e a automação dos processos laboratoriais o brasileiro do exemplo acima faz apenas uma vez a trabalhosa e cara viagem para o grande centro e, após coleta única de material recebe rapidamente o diagnóstico que se tornou mais barato, muitíssimo mais rápido e, consequentemente, acessível. E volta para a casa com a medicação adequada e a expectativa de uma rápida recuperação.

O SUS, que atende a 75% da população e que, sempre com carência de recursos, não reajusta sua tabela há décadas, conseguirá reduzir significativamente custos operacionais à medida que incorpora as inovações tecnológicas.

As melhorias nos fluxos de trabalho, as iniciativas sustentáveis, como a automação de processos laboratoriais e a utilização de tecnologias para reduzir desperdícios e a adoção de práticas ecoeficientes começam a produzir resultados positivos na saúde da população.

As parcerias estratégicas também são fundamentais na promoção de soluções mais integradas e acessíveis. No nosso setor, vão se formando parcerias com governos locais, ONGs e sistemas de saúde comunitários para levar exames de diagnóstico molecular a regiões carentes, onde o acesso à saúde sempre foi mais limitado

Ganha com isso a saúde pública e ganha principalmente a população, à medida que o Brasil busca caminhos para ser um país um pouco menos desigual, com oportunidades semelhantes na área da saúde, para aqueles que se valem da medicina privada e para os que contam exclusivamente com o SUS.

*Guilherme Ambar é biólogo e CEO da Seegene Brazil

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PORTAL G1

Mãe de bebê que morreu após serviço de home care da Prefeitura de Goiânia ser suspenso se revolta: 'Estão escolhendo quem salvar'

Empresa diz que serviço foi suspenso porque os repasses estão atrasados há mais de 5 meses. Maria Ayla Pereira Silva morreu 14 dias depois de completar 1 ano.

A mãe da bebê Maria Ayla Pereira Silva, que nasceu com uma síndrome rara e morreu após serviço de tratamento domiciliar da Prefeitura de Goiânia ser suspenso, desabafou sobre a morte da filha e lamentou a crise na saúde pública da capital. A empresa responsável pelo Home Care diz que não recebe os repasses públicos há meses e, por isso, o serviço está suspenso para algumas famílias.

“Suspenderam [ o serviço de Home Care de ] alguns e outros não. Então, eles estão tendo que escolher quem eles vão salvar. Isso é muito triste porque a gente, que é mãe, quer o melhor para os nossos filhos, apesar das condições deles. A gente tem que esperar pelos outros, né?”, desabafou Andreia Silva Oliveira.

Por ter nascido com uma síndrome rara, que provoca insuficiência respiratória grave, Maria Ayla dependia de oxigênio quase o tempo todo. A família entrou na Justiça para que ela recebesse tratamento em casa, pago pela Prefeitura de Goiânia. Depois de quase um ano, conseguiram. Mas o serviço foi suspenso após uma semana de uso, porque a empresa não estava recebendo a verba pública. A menina morreu 14 dias depois de completar 1 ano.

A Transmedica Home Care, empresa responsável pela assistência domiciliar e que é uma extensão da rede de saúde pública, informou, por nota enviada na última terça-feira (26), que não está conseguindo dar continuidade nos serviços por conta de um atraso de mais de cinco meses nos repasses financeiros da Secretaria Municipal de Saúde. A dívida ultrapassa R$ 4 milhões.

“A interrupção dos repasses da Secretaria Municipal de Saúde comprometeu gravemente a capacidade da empresa em manter suas operações, especialmente os atendimentos contínuos a pacientes de alta complexidade. (...) O impacto dessa situação na vida dos pacientes e na sustentabilidade da empresa exige uma ação rápida e eficaz das autoridades competentes”, afirmou a empresa.

g1 entrou em contato com a Transmedica por mensagem, enviada às 15h deste sábado (30), para saber se houve alguma reunião com a Prefeitura de Goiânia para resolver a situação. Mas, até a última atualização da reportagem, não houve retorno.

À TV Anhanguera, também na terça-feira (26), a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia disse que “trabalha para colocar o pagamento de todos os serviços em dia, inclusive o de Home Care”.

g1 também entrou em contato com a Secretaria de Saúde de Goiânia neste sábado (30), por e-mail enviado às 14h55, pedindo uma atualização da situação, mas não teve respostas até a última edição da matéria.

O caso Maria Ayla

Maria Ayla Pereira Silva nasceu no dia 12 de outubro de 2023, com síndrome de Moebius. Ao g1, o neuropediatra Rafael Monteiro Bruno e a oftalmologista pediátrica Renata Karina explicaram que se trata de uma anomalia congênita, em que ocorre paralisia de alguns nervos faciais e comorbidades como epilepsia e problemas respiratórios.

"É rara e não tem cura, pois é uma condição definitiva. Mas tem tratamento paliativo e das possíveis comorbidades , sendo o trabalho multidisciplinar essencial para a melhora da qualidade de vida do paciente", explica Rafael Monteiro Bruno.

Por conta desta síndrome, a menina passou a maior parte do tempo de vida internada em hospitais de Goiânia. A mãe, Andréia Silva Oliveira, precisou pedir uma licença no trabalho para acompanhá-la quase que em tempo integral.

Com a ajuda da Defensoria Pública de Goiás (DPE-GO), Andréia lutou para que a filha conseguisse o direito de receber o tratamento gratuito em casa, e conseguiu em outubro deste ano. A casa da família foi equipada com um berço e uma cama especial, aparelho de oxigênio e outros equipamentos.

Por uma semana, a menina pôde estar em casa, com o irmão e a família. E era acompanhada por médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e uma equipe técnica de enfermagem. No dia 22 de outubro, a família foi comunicada da suspensão.

“Para mim foi desesperador. Angustiante, né? Porque foi quase um ano de espera para poder trazer minha filha para casa. E quando finalmente a gente tem essa oportunidade de estar com ela em casa, eu perco esse amparo para cuidar dela”, explica a mãe.

No dia 23 de outubro, a Defensoria Pública se manifestou sobre o caso, pedindo ao Prefeito Municipal e ao Secretário Municipal de Saúde esclarecimentos a respeito do assunto. “Estamos aguardando seu retorno sobre as providências que serão tomadas para resolver a questão do atendimento home care dos pacientes”, cobrou o órgão.

Mas nenhuma atitude foi tomada. No dia 26 de outubro, a menina teve uma parada cardíaca, chegou a ser reanimada pela família e levada ao Hospital Célia Câmara, que fica a 1km da casa onde morava. Mas não resistiu e morreu.

“Ela teve uma parada cardíaca. Eu tentei. O que eu pude fazer, eu fiz, mesmo sendo leiga nesse sentido. Porque a gente treina, mas não sabe como um profissional, né? Eu tentei, reanimei, só que ela não respondia. A gente correu com ela para a maternidade, mas não adiantou”, lembra a mãe, Andréia Silva Oliveira.

Dívida de R$ 4 milhões

Segundo a Transmedica, atualmente, a falta de pagamento totalizou mais de R$ 4 milhões em dívidas acumuladas, resultando em:

Suspensão parcial dos serviços de atendimento domiciliar;

Impacto direto na saúde dos pacientes atendidos, que dependem da continuidade do tratamento para recuperação ou estabilização;

Desmotivação e insegurança entre os profissionais de saúde envolvidos nos cuidados, devido à incerteza quanto ao recebimento de seus salários e à manutenção dos seus empregos.

A empresa ressalta que a paralisação dos serviços afeta diretamente a qualidade de vida dos pacientes atendidos, uma vez que muitos deles dependem de tratamento contínuo e assistência especializada.

Para a solução do problema, a Transmedica recomenda uma reunião de urgência com representantes da Secretaria Municipal de Saúde para um plano de regularização dos repasses. Na visão da empresa, é preciso que haja a implementação de um plano de pagamento escalonado, para que a empresa possa retomar os serviços gradativamente.

Crise na saúde

Goiânia vive um caos na saúde pública. Além dos problemas relacionados ao Home Care, durante a gestão do prefeito Rogério Cruz, três maternidades públicas suspenderam os atendimentos eletivos várias vezes ao ano por falta de recursos públicos. Além disso, nas últimas semanas, pelo menos cinco pessoas morreram à espera de leitos de UTI em Goiânia.

Na quarta-feira (27), o então secretário de Saúde Wilson Pollara, o diretor financeiro Bruno Vianna e secretário executivo de Saúde Quesede Ayres foram presos suspeitos de pagamento irregular em contratos administrativos e associação criminosa na secretaria.

Em meio à crise, a superintendente de Gestão de Redes de Atenção à Saúde, Cynara Mathias Costa, foi nomeada como nova secretária municipal de Saúde da capital.

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Assessoria de Comunicação